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Vôlei na era do ouro


O campeão olímpico Rodrigão, que conquistou muitas medalhas no vôlei, planeja trabalhar durante sua aposentadoria com projetos de educação na baixada santista
Rodrigo Santana, 37 anos, tem muita história para contar. Com três olimpíadas no currículo, uma medalha de ouro e duas de prata, o atleta é um exemplo de raça e determinação. Rodrigão do vôlei, como é chamado, chegou para a entrevista de bermuda, camiseta e chinelo. Do alto de seus 2,05 metros de altura, usou o bom humor para se desculpar pelo atraso de quase uma hora. Ele decidiu que a conversa com a reportagem da Viral seria ali mesmo, no hall do prédio em que reside, em Praia Grande. 

Mas ao final da conversa, a equipe já estava no apartamento para ver de perto a coleção de troféus e medalhas. A casa de Rodrigão é típica de um homem solteiro, com algumas peças de roupa espalhadas e decoração bem clean. Para onde quer que se olhe há objetos, bolas, medalhas, troféus, fotos de alguns momentos dele em quadra e até camisas autografadas por grandes atletas.


Nem sempre Rodrigo morou em Praia Grande. Ele cresceu em Osasco, onde começou sua carreira de atleta. Porém, seus padrinhos eram de Praia Grande, então ele passou boa parte da infância na cidade, pela qual ele ficou bastante ligado. “Sempre gostei daqui e como nunca pude ter um lugar fixo por causa da profissão, fiz de Praia Grande a minha base. Antes aqui era só para passar as férias. Eu nasci em Pirituba, mas com 19 anos já estava morando aqui”. 

Aposentado das competições, ele revelou que pretende tocar alguns projetos esportivos na cidade, que, segundo ele, têm muito potencial para o desenvolvimento do jovem no esporte. Rodrigão tem conversado com o prefeito Alberto Mourão sobre alguns projetos, mas são todos para 2017. “O importante do esporte é que ele ensina valores importantes. Disciplina e dedicação, por exemplo. Então mesmo que as crianças não sigam carreira esportiva, terão uma boa base. Aqui tem muitas crianças que moram em comunidades, e o ídolo delas, muitas vezes, é o dono do morro, o traficante, isso tem que mudar. Se o ídolo dele for um jogador de vôlei, de natação, ou qualquer outro esporte, isso muda o foco. A gente tem que trazer o ídolo pra perto das crianças”.

Ele conta que, desde muito jovem, escuta que é alto, que deveria se dedicar ao basquete ou ao vôlei, mas o interesse pelo esporte ainda não tinha despertado. Aos 13 anos, incentivado pela Geração do Ouro Olímpico de Barcelona de 1992, ele decidiu fazer um teste no time do Banespa, clube de tradição do voleibol paulista e que já contava com atletas de peso, como o Tande. Rodrigão foi no último dia da peneira e acabou garantindo uma das últimas vagas. Por um ano inteiro ficou no banco, não entrou em nenhum jogo e não se destacava. Mas, com muito treino, após quase dois anos de Banespa ele conseguiu entrar em quadra em um dos jogos próximos da final do campeonato. 

“Foi uma sensação boa, pois tinha um olheiro da seleção brasileira, que me convidou para ficar de reserva na seleção infantojuvenil”. A partir daí as coisas mudaram na vida de Rodrigo. Em 1994 ele foi convidado a morar nos alojamentos do Banespa e estava no banco de reservas da seleção brasileira. Em 1995, após três anos de experiência no esporte, foi convocado para jogar no time titular da seleção brasileira infantojuvenil. Foi quando ele foi para o time do Suzano, e ficou no banco de reservas do time adulto da seleção brasileira. “Saí do Banespa pois lá nunca fui titular e o Suzano me fez uma boa proposta. Me chamaram para ser titular na minha categoria e reserva da categoria adulto”.


No Suzano, a carreira do atleta deslanchou. Depois da passagem vitoriosa de quatro anos pelo time, Rodrigão jogou em diversos clubes do exterior. O primeiro foi o Estense 4 Torri Ferrara, depois o Lube Banca Marche Marcerata, ambos da Itália, e ainda Ziraat Bankasi Ankara, da Turquia. Sua última experiência estrangeira foi no Barij Essence, do Irã. 

O último jogo oficial de Rodrigão foi em 2015, na Indonésia, onde o atleta ficou por três meses. “No meu último jogo, não teve nada demais, acho que a sensação mais emocionante foi mesmo na final olímpica, em 2012, quando eu estava deixando a seleção. Uma sensação de dever cumprido”. 

Mesmo com toda essa experiência, o clube que mais marcou sua carreira foi o Suzano, não por ser o primeiro clube grande, mas porque atletas, comissão técnica e dirigentes viviam como uma grande família. 

Segundo o atleta, algumas vezes esse amor se tornava loucura, como quando o técnico comprou 300 máscaras do filme “Pânico” e distribuiu pela rquibancada, para poder assistir a um dos jogos disfarçado, pois estava expulso e não poderia acompanhar a partida. Segundo o atleta, para monitorar a viagem da equipe a caminho do jogo, o treinador costumava pedir para que o pessoal do pedágio ligasse para ele, avisando quando eles passassem pelo ponto. “Pra você ter ideia da loucura, ele colocou o Giba para morar em frente à casa dele, pra monitorar quando ele ia dormir, a hora que acordava. Tinha vezes que ele ligava na casa do Giba e falava: ´Ô Giba, já são 23h30, tá na hora de apagar a luz`.O amor e zelo ultrapassavam os limites. Mas eu sei que era por cuidado e puramente amor” relembra Rodrigão.

Com 18 anos Rodrigão teve o primeiro filho e, um ano depois, o segundo. Por estar no início de carreira, tudo foi difícil. Ele ganhava R$ 450 por mês, cerca de R$ 800 em valores de hoje. “Eu tinha dois filhos para criar, então essa época foi bem difícil, mas o vôlei sempre foi a solução pra mim”. Segundo ele, a carreira já estava consolidada, mas não tinha estrutura para criar dois filhos, mas acredita que tudo valeu a pena. “Minha relação com eles é muito boa. Hoje tenho três filhos: o mais velho, Victor Hugo (18) joga vôlei; a minha filha, Rafaela (16) não se interessa por esporte, quer outras coisas; e o mais novo, Pedro Henrique (8) é tranquilo também, mas é pequeno, não sabe o que quer, só quer brincar. Toda aquela parte complicada do começo, de não saber como criar, o que fazer, me ajudou muito hoje. A gente sai junto, conversa, brinca junto”.


Rodrigão se sente orgulhoso e bem exigente quanto ao empenho do filho mais velho no esporte. “Opino muito nos jogos. Eu critico demais porque acho que ele é muito preguiçoso. Trouxe dois atletas aqui em casa pra treinar no começo do ano e eu mostrei o porquê de eles serem melhores. Eu falava pra gente treinar às 7h, eles estavam de pé. Já meu filho não, ficava enrolando. Fiz um campeonato e meu filho ganhou no grupo, porque estava jogando com esses dois. Na disputa em duplas foram eles que ganharam porque treinavam todos os dias com afinco, enquanto ele estava com preguiça. Eu sempre falo onde ele erra, e ele sempre me dá diversas desculpas, mas faz parte”, contou o ex-jogador. 

Rodrigão considera o Lube Banca Marche, no qual jogou entre 2005 e 2008, o melhor. “Cheguei no meio do campeonato, que já estava quase perdido, e conseguimos vencer. Foi o título que eu mais comemorei”. Ele conta que havia 12 mil pessoas no estádio e os torcedores invadiram a quadra. “Eu saí quase sem roupa”, relembra. Depois disso, voltou para o Brasil para jogar no Pinheiros Sky que, segundo ele, tinha um projeto muito bom, mas foi mal administrado. 

O voleibolista trabalhou bastante para chegar onde chegou. Rodrigão desabafa que é uma profissão difícil, pois sacrifica muitas coisas, como o aniversário dos filhos, os momentos em família, mas no final é recompensador. “Nunca imaginei essa fama. Comecei a perceber o tamanho do meu nome quando fui jogar fora, aí percebi que as pessoas estavam me observando» conta o esportista. Hoje, Rodrigão pensa em ser técnico, mas para isso é necessário estudo e muita burocracia, então ainda vai esperar.

As Olimpíadas serão no Brasil e muitas pessoas se perguntam se o País tem estrutura para o evento. Para o atleta, que já esteve em Atenas, Pequim e Londres, a resposta é sim. Segundo ele, mesmo com os problemas, há muita gente competente no Comitê Olímpico. “Chance de ganhar sempre tem, mas os times são muito fortes. Chances claras de medalha. Meu medo maior é a falta de foco”. Na opinião dele, quando o time vai jogar fora do país, existe o assédio da imprensa, mas não é igual quando se joga no Brasil. “Eu quero ver como vai ser isso, porque o atleta não pode sair da quadra às 22h e ir tomar café com a Ana Maria Braga no dia seguinte. A gente tem que fechar muito bem o grupo pra essas coisas não acontecerem”, analisa o ex-jogador. 

O vôlei na vida de Rodrigão representa tudo, toda uma história, sua vida. Ele começou a jogar se inspirando em Dante, mas conta que hoje em dia não tem um ídolo específico, pois todos os jogadores têm uma história muito legal por trás.

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