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O amor e a luta diária pela aceitação


Foto: Fábio Prado

Por: Gilson Santos
Edição: Bruna Capella, Danielle Lopes e Vitor Henrique

O Brasil é um país miscigenado, onde convivem de forma aparentemente harmônica incontáveis culturas, costumes e crenças. Apesar disso, uma coisa parece ser ainda comum em qualquer parte dos 26 estados da nação: o preconceito.

De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), os negros representam 54% da população brasileira. Mesmo assim, casais de etnias diferentes ainda são um tabu na sociedade. 70% dos casamentos no País ocorrem entre pessoas da mesma cor, tornando a raça um fator predominante na escolha de parceiros conjugais, aponta outra pesquisa do IBGE.

“Teve uma situação antes de começarmos a namorar onde ela disse para uma certa pessoa que queria namorar comigo, e a pessoa a questionou sobre a minha condição financeira, atrelando meu saldo bancário, eu acredito, à minha etnia”.


O relato é do operador de serviços internos e estudante de engenharia, Matheus Trindade da Silva, 22 anos. Trindade conheceu a assistente administrativa Nicolli Hofmann Dias quando ela começou a frequentar a igreja da qual ele já fazia parte. Juntos há um ano e meio, eles têm suas diferenças, assim como qualquer outro casal, mas a que mais marca o casal é o fato de Trindade ser negro, e ela, branca.

De acordo com o casal, eles já não são sofrem com comentários preconceituosos, apesar de notarem comportamentos estranhos que são manifestações claras em relação à diferença de etnia.

“Por diversas vezes em lojas, quando entro sinto seguranças e outras pessoas olhando. Teve uma vez até que recente, a Ni entrou no mercado e eu fiquei na porta e a galera não parava de me olhar”.

Devido a problemas em um outro relacionamento, Nicolli sentiu necessidade de preparar o pai para aceitar o namoro.  “Meu pai não é racista, ele tem amigos negros, mas ele não imagina a filha dele namorando”, conta a assistente administrativa. Ela ficou com receio, mas conta que no final tudo ocorreu bem: “Fui preparando meu pai, porque eu sabia que ia namorar com o Matheus e era importante a aprovação dele e no final deu tudo certo e ele aceitou”.


Foto: Arquivo Pessoal (Facebook)

Leonardo Morais e Vitor Santinni
Assim como relacionamentos de etnias distintas, casais gays também são um tabu e ainda não são aceitos abertamente na sociedade. No caso do estudante de engenharia civil, Leonardo Morais, 19 anos, e o estudante de moda, Vitor Santinni, 23 anos, o casal precisa tomar alguns cuidados para que o preconceito não seja parte do cotidiano.


 “Em lugares menos frequentados e em ruas mais vazias e discretas a gente anda de mão dada, caso contrário, é difícil a gente andar junto na frente de muita gente por causa do preconceito, preferimos evitar esses casos. Lugares que nos sentimos a vontade é a minha casa e baladas GLS”, conta Morais.
Apesar de estarem juntos há um ano e três meses, o casal já se conhece há cinco anos por meio de um amigo em comum, por isso, eles sentem que a aceitação da família foi mais tranquila, com exceção da mãe de Santinni, que no começo, foi contra a união.
Da parte estudante de engenharia, a aceitação ocorreu de forma mais tranquila, apesar de seu receio. “Meus amigos reagiram todos bem e eles me ajudaram a encorajar eu contar para a minha família. Minha mãe e meu padrasto, ambos com mais de 50 anos de idade, reagiram bem e queriam ver minha felicidade. Fiquei muito aliviado”, explica.

Diferença de idade
Por mais que relacionamentos com grandes diferenças de idade já não causem tanta estranheza na sociedade, ainda há casos isolados em que o casal sofre o preconceito, como o caso da estudante de administração Hiuly de Souza, 21, e o marido Jonas Junior, 42, que se viram diante de uma situação complicada para que a família da Hiuly aceitasse a união.
“Sofri, e não foi pouco! Quando meus pais descobriram - depois de quase um ano juntos -, apanhei. Minha mãe queria me tirar do serviço e do curso que eu fazia para eu não sair de casa e não me encontrar mais com ele, ou seja, queria fazer de tudo para que eu não tivesse nada com ele”, relata a estudante. Diante desta situação, o casal decidiu morar junto, e agora, pouco mais de três anos após o ocorrido, Hiuly já fala com a mãe normalmente.
Apesar da turbulência com os pais da jovem, a reação da família de Junior e os amigos do casal foi positiva. “A família dele sempre nos apoiou bastante, até porque viram que estávamos juntos e nos assumimos porque queríamos e gostamos um do outro de verdade, sem qualquer interesse. Enquanto aos nossos amigos, a maioria sempre nos apoiou e ficou feliz por nós quando resolvemos morar juntos”, conta.

Redes sociais
Mas por que razão a reação da sociedade diante de situações que não estão acostumados é a intolerância? Porque o Brasil é preconceituoso. É o que diz a psicóloga Luci Mara da Silva, que se baseia nas redes sociais para explicar.

“Com as redes sociais, as pessoas se sentem mais à vontade para expor seu preconceito. Ela dá voz a essas pessoas, o que faz parecer que o preconceito aumentou, mas ele sempre esteve presente”, explica.

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